A família de Ariana Pereira cultivou, durante séculos, cana-de-açúcar, fava, mandioca, frutas e verduras. Cerca de três anos atrás, entretanto, a tradição foi interrompida, porque os córregos que passavam pela sua fazenda secaram. A agricultora, de 32 anos, mora com o companheiro e três filhos na área rural de Correntina, no Vale do Arrojado, no Cerrado baiano.
Ariana conta que a água sumiu devido aos constantes desmatamentos para o avanço do monocultivo de soja. Além disso, a irrigação dessas lavouras demanda um grande volume de água, o que contribui para o desaparecimento de córregos. Na região de Ariana, Oeste da Bahia, a soja passou de 381 mil hectares, em 1993, para 1,6 mi, em 2018, ou seja, houve um aumento de 420% de área plantada em apenas 25 anos.
Segundo levantamento da Comissão Pastoral da Terra (CPT), de 45 rios da bacia do rio Corrente, onde vive Ariana, apenas cinco seguem perenes. Dois morreram, dois são semi-perenes e 36 são intermitentes, ou seja, possuem água durante o período chuvoso, mas secam durante o período da estiagem.
De acordo com o autor da pesquisa e educador social da CPT do Oeste da Bahia, Samuel Britto, “esses rios secaram em um período de aproximadamente 37 anos, ou seja, as transformações vêm ocorrendo desde meados dos anos 80”.
Assim como Ariana, famílias de agricultores, pescadores e indígenas estão perdendo a capacidade de produzir alimentos devido ao avanço do agronegócio no Cerrado brasileiro. Seja por perderem suas terras, o acesso a recursos hídricos ou por terem seus cultivos destruídos por agrotóxicos, essas comunidades tradicionais, cercadas por imensas plantações de soja, cana, milho e algodão, ficam em situação de insegurança alimentar e vulnerabilidade. Há ainda famílias na região afetadas pelos efeitos da mineração, sem poder pescar ou plantar desde o rompimento da Barragem de Brumadinho, em janeiro de 2019.
Atualmente, 110 milhões de hectares do Cerrado estão ocupados pelo agronegócio, de acordo com o artigo “Ecocídio nos Cerrados: agronegócio, espoliação das águas e contaminação por agrotóxicos”, de pesquisadores de universidades federais e da Fiocruz.
Considerando a superfície, o desmatamento acumulado do Cerrado até 2021 era de pouco mais de 100 milhões de hectares (49% do bioma), enquanto o da Amazônia era de 74,68 milhões de hectares (18% do bioma), como consta no documento apresentado no Tribunal Permanente dos Povos em Defesa dos Territórios do Cerrado.
Vale lembrar que o desmatamento no Cerrado teve início no século XX, mais precisamente a partir de 1960, ou seja, em pouco mais de 60 anos, o bioma perdeu metade da sua vegetação.
Além do desmatamento, a expansão do agronegócio tem um profundo impacto nos recursos hídricos na região. As atividades de produção de soja, cana, milho e algodão apostam no uso intensivo da irrigação por pivôs centrais – estruturas suspensas que dispersam água em movimentos circulares sobre as plantações.
Esse mecanismo, ainda segundo o artigo mencionado acima, exaure as águas superficiais e subterrâneas no Cerrado, “resultando na migração de nascentes, na interrupção dos fluxos dos rios e na redução dos volumes dos aquíferos”. Só para ilustrar, entre 1980 e 2015, ou seja, em 35 anos, a alimentação do Rio São Francisco pelo Aquífero Urucuia sofreu uma redução de 49,2%, aponta o artigo, citando estudo de pesquisadores da UNESP.
O impacto dessa exploração tende a extrapolar as fronteiras do Cerrado, uma vez que a região abriga as nascentes de oito das doze bacias hidrográficas existentes no país, o que a faz ser conhecida como “Berço das Águas”.
Fechando o pacote de ocupação do Cerrado está o uso massivo de agrotóxicos e insumos químicos. Essa prática envolve desde a aplicação de produtos para realizar a adequação do solo para o cultivo até as pulverizações aéreas para combater pragas.
Em 2018, apenas os cultivos de soja, milho, cana-de-açúcar e algodão no Cerrado foram responsáveis por 73,5% do total de agrotóxicos consumidos em todo o Brasil, o equivalente a mais de 600 milhões de litros, segundo levantamento de pesquisadores de universidades federais e da Fiocruz.
O uso extensivo de agrotóxicos, sobretudo por pulverização aérea, contamina a produção alimentar das populações, o solo e a água, principalmente pelo efeito deriva, que conduz o produto químico para além do local da aplicação.
De produtor de alimento a consumidor de ultraprocessados
Desde que os córregos que passavam pela fazenda de Ariana secaram, não há mais água para o cultivo de alimentos ou a criação de animais. Sua família é abastecida pela rede municipal, mas a água serve apenas para o consumo humano. Mesmo assim, a quantidade é racionada, para que seja suficiente para todos os moradores da comunidade.
Foi assim que os ultraprocessados entraram na vida de Ariana. Hoje ela vive da renda do Programa Auxílio Brasil e, para garantir o máximo de itens na cesta, recorre aos produtos industrializados. “As coisas estão muito caras, então, eu compro bolacha, óleo, macarrão. Antes, isso dava para uns 20 dias, aí o resto do mês a minha mãe complementava quando podia”, explica a agricultora.
Quando a dispensa fica vazia e a ajuda da mãe acaba, ela conta com eventuais doações da comunidade e torce para que apareça uma “diária no roçado”. Geralmente, o valor pago por um dia de trabalho, capinando ou plantando em roças particulares, é de R$ 50. De todas essas alternativas, apenas a renda do auxílio e a ajuda da mãe são seguras. “A gente vai se virando, come o que aparece.”
Quando Ariana relembra a sua história alimentar, é possível ter uma ideia do quão radical foi a mudança no seu cardápio, passando da comida in natura para os ultraprocessados. Um exemplo ilustra bem essa transição: ao longo de grande parte da sua vida, Ariana participou do ritual coletivo de plantio e colheita da cana-de-açúcar para a produção de rapadura. Suas primeiras lembranças da infância são da avó liderando a produção, e o tio cedendo o engenho para a fabricação do doce, que envolvia várias pessoas da comunidade.
Enquanto Ariana moía a cana no engenho “tocado”, ou seja, movimentado pela tração do boi, outro coava a garapa, e o próximo se encarregava de colocar o líquido no tacho para fazer a rapadura. Segundo a agricultora, o melhor momento era tirar lascas da rapadura para adoçar o café.
O doce também era usado na produção de remédios e na fabricação de sobremesas. Hoje, o café da família de Ariana é adoçado com açúcar refinado, e os seus três filhos nunca viram um engenho de cana. Já a rapadura só entra no cardápio alimentar se for comprada. E, como o dinheiro é pouco, o jeito é dar prioridade a outros itens.
“A gente deixou de ter uma alimentação saudável, e tá comendo mais alimentos industrializados. Eu adquiri umas alergias, creio que foi por causa da alimentação, pois eu não era acostumada a comer alimentos industrializados”, afirma.
Indígenas cercados por agrotóxicos
Erileide Domingues, professora indígena e liderança Guarani Kaiowá, da Terra Indigena Guarani Guyraroká, conta que seu povo vem sentindo os impactos da expansão das monoculturas e do uso do agrotóxico na região. Ela vive na área rural de Caarapó, na região sul do Mato Grosso do Sul. “Estão matando a comida, junto com o povo indígena”, afirma.
Erileide diz que a aplicação de agrotóxico em plantações vizinhas à Terra Indígena acontece a cada três ou cinco dias. Mas, quando chove, os fazendeiros costumam repetir a aplicação, e a frequência aumenta. Segundo ela, a pulverização é feita com tratores ou aviões, que passam bem próximo das casas indígenas, fazendo com que o produto químico atinja os moradores e suas áreas de cultivo. Quando a safra da vez é de soja, “é muito pior”, afirma ela, porque o uso dos produtos químicos é mais intenso.
“O [nosso] milho, por exemplo, até cresce, mas não produz, o jeito é cortar tudo [e jogar] fora. Nem as sementes nós conseguimos tirar como tradicional, porque a planta não produz [o grão]. Nós, indígenas, plantamos o milho em outubro e quando vamos colher no final do ano, não tem nada, porque a planta não desenvolve”, afirma Erileide.
Os Guarani Kaiowá costumam armazenar sementes crioulas para o cultivo de alimentos, mas, segundo Erileide, essas sementes não têm resistido aos insumos químicos aplicados nas terras vizinhas. Assim, os agrotóxicos não apenas inviabilizam as plantações nas aldeias, mas colocam em risco o patrimônio alimentar e cultural da etnia.
“A gente sofre com os ataques dos agrotóxicos. Não dá mais para produzir. Nós, indígenas, produzimos para o consumo próprio, mas, antes da colheita, eles [os fazendeiros] passaram agrotóxicos e mataram as plantas de muitas famílias. Agora, na colheita do milho, algumas famílias conseguiram tirar milho, abóbora, arroz, mas outras não conseguiram. É um desânimo total pra gente!”, desabafa.
O avô de Erileide, Tito, lembra que o seu povo cultiva e consome arroz, batata, abóbora e amendoim há séculos. Atualmente, entretanto, a produção não é suficiente para se alimentarem. Com isso, passaram a recorrer aos ultraprocessados, que chegam às comunidades em cestas básicas doadas pelo governo estadual, ou passam fome.
“A gente recebe uma cesta básica. Vem arroz, óleo, mas muitas vezes vem comida estragada, que não se sabe quanto tempo estava guardada ali. A gente prefere produzir o nosso próprio alimento, usando semente crioula, que é boa. Meu avô diz que os indígenas estão morrendo por causa dos ultraprocessados. A gente quer ter o direito ao nosso território de volta para sobreviver, cuidando da terra e para passar [a terra] para os outros indígenas que vão vir”, conclui.
Além dos impactos dos agrotóxicos e do desmatamento, o acesso à terra e a sobrevivência do povo de Erileide foi afetado por uma disputa judicial. Em 2004, a Fundação Nacional do Índio (Funai) identificou e delimitou 11 mil hectares como sendo a Terra Indígena Guayraroká. Em 2009, o Ministério da Justiça declarou as terras como de ocupação tradicional indígena.
Cinco anos depois, entretanto, o Superior Tribunal Federal (STF) anulou a demarcação. As famílias da aldeia vivem hoje numa área de 55 hectares, uma pequena parcela da terra original, de acordo com o Conselho Indigenista Missionário (CIMI). Com a decisão do tribunal, a comunidade também perdeu acesso a um rio, que servia para irrigar suas plantações.
Em setembro de 2019, a Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) concedeu uma medida cautelar em favor da comunidade Guyraroká, reconhecendo “a grave situação humanitária que sofrem os povos Guarani e Kaiowá”. Na medida, a CIDH afirma que, segundo os solicitantes, os indígenas “foram sujeitos a uma série de ameaças, assédio e atos de violência supostamente perpetrados por proprietários de terras no contexto de um conflito fundiário”.
Revolução verde
A situação dessas comunidades tradicionais se agravou durante o processo de modernização agrícola, parte da chamada Revolução Verde, que se desenvolveu em todo o Cerrado, principalmente no estado do Mato Grosso. Na década de 70, o governo federal impulsionou o Programa de Cooperação Nipo-Brasileira para o Desenvolvimento dos Cerrados (Prodecer), com financiamento do Japão. O projeto fomentou o desenvolvimento do cultivo de grãos e commodities na região e abriu as portas para grandes empresas do agronegócio e para a mecanização.
Segundo o professor e pesquisador da Universidade Estadual de Goiás (UEG) Murilo Mendonça, o Prodecer lançou as famílias tradicionais em um cenário de insegurança alimentar. O processo começa com o desmatamento, que avança sobre os territórios tradicionais e, com o passar do tempo, afeta as fontes de água, que secam ou ficam poluídas pelos agrotóxicos.
Com menos terra e água, as famílias perdem a capacidade de produzir. Muitas passam a depender de renda ou auxílios governamentais para comprar alimentos, cada vez mais caros, e trocam comida in natura por produtos ultraprocessados.
“Temos um processo que envolve a mecanização, a utilização de adubos químicos, de agrotóxicos, sementes híbridas, sementes transgênicas e, agora, as novas biotecnologias, que demandam o aumento no uso de agrotóxicos. No seu auge, esse projeto atinge as famílias tradicionais no campo da destruição dos bens naturais, da cultura e da transmissão de saberes”, explica.
Cerrado: um vazio demográfico?
O projeto de desenvolvimento do Cerrado se alicerça sobre uma ideia: a de que a região é um vazio demográfico. De acordo com o advogado popular da Associação de Advogados de Trabalhadores Rurais da Bahia, Maurício Correia, foi com esse conceito, que desconsiderava a existência de povos indígenas, quilombolas, geraizeiros, entre outros, que Juscelino Kubitschek criou Brasília e a rodovia Belém-Brasília.
“O primeiro crime que veio a gerar a ideia de genocídio e ecocídio foi desconsiderar que esse território era ocupado. Isso, inclusive, fez com que a sociedade civil brasileira, na época, não se revoltasse e até apoiasse a ocupação do Cerrado, celebrando a chegada das fazendas de soja”, afirma Correia.
Em outro momento, a apropriação das terras para expansão agrícola ocorre através da concessão por parte do Estado ou através de grilagem. Nesse último caso, as terras, em sua maioria originárias de posseiros sem documentação legal, passadas de pai para filho por meio de costumes, são adquiridas através de fraudes cartoriais – uma prática conhecida como “inventar o inventário”.
“Eu afirmo, com base em mais de dez anos de análises e estudos, que no Cerrado não existe expansão agrícola sem grilagem de terras. Em todo o Cerrado, eu encontrei apenas dois títulos de valor jurídico. Os demais foram feitos com fraudes cartoriais”, diz Correia, que analisou a relação entre desmatamento e grilagem na expansão agrícola do Cerrado, no estudo “Na Fronteira da Ilegalidade: desmatamento e grilagem no Matopiba”.
Outra prática que vem sendo adotada e que também está impactando na produção alimentar das famílias é a grilagem verde. O Código Florestal exige manter 35% de uma área preservada como reserva legal. Em muitos casos, os latifundiários têm adquirido terras com vegetação nativa para registrar como reserva legal.
Eles compram áreas de baixios, comumente usadas pelas famílias para produção de alimento, e apresentam à Justiça como forma de atestar o cumprimento da lei. “As famílias estão sendo encurraladas [..], com cada vez menos terra para plantar. Por isso, antes de pensar em política fundiária, é preciso pensar na demarcação dos territórios tradicionais”, defende Correia.
Segundo o conceito de soberania alimentar, a comida é mais do que nutrientes e calorias, é patrimônio. Com isso, as perspectivas da saúde, do direito humano, culturais, afetivas, a biodiversidade, a construção e transmissão de saberes devem ser levadas em consideração. Os saberes que fazem parte dos sistemas alimentares do Cerrado foram guardados, transmitidos e aperfeiçoados pelos povos tradicionais por séculos.
Para Juliana Casemiro, professora da Universidade Estadual do Rio de Janeiro e coordenadora da campanha Comida é Patrimônio, com a perda da capacidade de produção alimentar, essas famílias se tornam reféns da comida industrializada.
“Nós estamos vendo um avanço do sistema alimentar do agronegócio, que serve à produção de ultraprocessados, que tendem a padronizar a dieta alimentar. Falar que comida é patrimônio é defender os saberes que nos tornam fortes frente a esse processo. Não é algo romântico, significa pensar em combater a fome, pensar na alimentação das gerações futuras, em meio às mudanças climáticas, criando sistemas alimentares saudáveis e sustentáveis”, pondera Casemiro.
Mineração: rio poluído e animais que morrem ‘repentinamente’
“Você me pegou em um dia difícil. Estou muito chorosa”, justifica, entre lágrimas, Eliana Marques, pescadora da comunidade Cachoeira do Choro, no município de Curvelo, no Cerrado mineiro. Em um esforço para manter o controle, ela prossegue: “Hoje, a gente não consegue mais pescar porque tudo está proibido. Também não produzimos mais alimentos, pois é proibido usar água do rio [Paraopeba]. Só que a nossa comunidade existe por causa do rio, tudo acontece por causa do rio, seja a criação de gado, o comércio, restaurantes, os quintais produtivos”, explica ela, soluçando.
A comunidade Cachoeira do Choro foi uma das afetadas pelo rompimento da Barragem de Brumadinho, ligada à empresa de mineração Vale do Rio Doce, em janeiro de 2019. O desastre foi responsável por espalhar cerca de 12 milhões de m³ de rejeitos ao longo de 26 municípios mineiros.
Em Cachoeira do Choro, a chegada da lama contaminada pôs fim à fartura, em termos de alimentação, da comunidade. As famílias plantavam caju, jabuticaba, goiaba, banana, manga, acerola e abacaxi. Cultivavam ainda diversas variedades de mandioca, milho, verduras e legumes, e criavam galinhas para produção de ovos. Os alimentos serviam para subsistência e eram partilhados entre os vizinhos.
Análises feitas pelo Instituto Guaicuy nos sedimentos na margem e no fundo do rio Paraopeba de Cachoeira do Choro, entre 2020 e 2022, identificaram a presença de substâncias como níquel, cromo, arsênio, chumbo e cobre, em níveis que oferecem “riscos de efeitos prejudiciais à vida aquática”, afirma o documento.
Já na análise da água, realizada em fevereiro deste ano, foi identificada a presença de alumínio, manganês e bactérias, o que levou o Instituto Mineiro de Gestão das Águas a não recomendar o uso do rio para qualquer finalidade, como nadar, pescar ou irrigar.
Na época, as famílias se desfizeram dos animais, para evitar que eles morressem. Os quintais, que antes eram fartos, hoje, não têm fruto. Segundo Eliana, as plantas, os animais, tudo na comunidade está estranho. “Deixamos de comer as aves e os ovos da comunidade, porque esses animais passaram a morrer repentinamente”, afirma a pescadora.
Eliana diz que a família vive atualmente da aposentadoria do seu marido. E que precisam viajar cerca de 100 km para comprar comida, porque não há supermercados próximos da sua casa. “A gente come mais ultraprocessados e só consumimos ovos, porque a perda da renda não permite comprar carne”, diz.
Logo após o desastre, afirma Eliana, a Vale realizou um acordo no qual se comprometeu a garantir a distribuição de água potável e a realizar o pagamento de um auxílio emergencial. Para ter acesso aos benefícios, ainda de acordo com a pescadora, os moradores deveriam apresentar diversos documentos, inclusive comprovação de posse da terra.
“No território, tem moradores de toda forma, temporários, fixos, que nem sempre têm a documentação que comprove a posse da terra. Então, muitos ficam de fora. Eu recebi o auxílio por um mês. Depois eles rejeitaram a minha documentação”, afirma.
Atualmente, o cadastro e pagamento do Programa de Transferência de Renda, destinado às pessoas atingidas pelo desastre, são geridos pela Fundação Getulio Vargas (FGV). Procurada, a FGV respondeu que o benefício de Eliana e de outras 30 mil pessoas foi bloqueado pela Vale, que administrava o Pagamento Emergencial até novembro de 2021.
A fundação disse que foi selecionada pelas instituições de Justiça, por meio de edital público. Logo após ser escolhida como gestora, segundo a assessoria, a FGV abriu um recadastramento para essas 30 mil famílias – no caso de Eliana, afirma a fundação, é possível que o seu benefício ainda esteja aguardando definição das instituições de Justiça.
Sobre o abastecimento de água, Eliana conta que chegou a ser atendida pela Vale, mas que havia problemas com o fornecimento. Após reclamar com a empresa, ela diz que foi procurada por um representante, mas se recusou a falar com ele sozinha. “Disse que só falava com ele na presença da assessoria técnica ou que ele enviasse um email. Ele enviou um email que dizia que eu não estava dentro dos critérios, e o fornecimento de água foi cortado”, lembra.
Questionada, a Vale respondeu que os critérios para acesso à água potável não mudaram e foram definidos com base em nota técnica do Instituto Mineiro de Gestão das Águas. A empresa afirmou ainda que “todos os moradores elegíveis de Curvelo e outros 15 municípios impactados recebem, desde 2019, água mineral e água potável nas quantidades que necessitam”.