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Movimento global de solidariedade entre povos indígenas amplia diálogos com universidades

Mulher Indígena LGBTQIA+ Yacunã Tuxá desde cedo sentiu a importância de estar em coletividade e lutar pelos direitos da sua comunidade – Arte sobre obra de Yacunã Tuxá/Revista Etnográfica/CC BY-NC 3.0

Nas últimas décadas cresceu um movimento global de solidariedade entre povos indígenas, afrodescendentes e comunidades tradicionais, unidos para defender e preservar territórios, sua diversidade cultural e linguística. Embora distantes geograficamente, as experiências de indígenas da Bahia, de São Paulo e de Connecticut foram reunidas em um artigo publicado na revista portuguesa Etnográfica, integrando a comunidade internacional que luta por espaços seguros de diálogo para todos os povos.

As contribuições são de três pessoas indígenas atuantes em educação: Yacunã Tuxá (Rodelas, Bahia), Luã Apyká (Tupi Guarani, São Paulo) e Natasha Gambrell (Eastern Pequot, Connecticut) e de acadêmicos indígenas e não-indígenas do Brasil e Estados Unidos. As conversas aconteceram no Seminário Internacional Povos Indígenas e Afrodescendentes nas Américas: Colaboração, Arqueologia, Repatriação e Patrimônio Cultural, em 2023 e 2024, em uma colaboração entre o Laboratório Interdisciplinar de Pesquisas em Evolução, Cultura e Meio Ambiente do Museu de Arqueologia e Etnologia (MAE) da USP e os laboratórios Latin American Historical Archaeology e New England Indigenous Archaeology da Universidade de Massachusetts, em Boston.

“O texto apresenta um debate crítico que deve ser considerado nas arqueologias indígenas e da diáspora africana, especialmente sobre o reconhecimento de territórios, da diversidade cultural e metodologias possíveis para a descolonização da disciplina. É resultado de nossa profunda solidariedade, refletindo a urgência em construir pesquisas que dialoguem, efetivamente, com a diversidade dos conhecimentos e produzam resultados práticos em benefício das comunidades”, explicam Marianne Sallum, mestre, doutora e pesquisadora em arqueologia pelo MAE, e Daniela Balanzátegui, mestre e doutora em arqueologia pela Universidade de Simon Fraser (Canadá). Elas organizaram a publicação na revista.

Para as pesquisadoras, essa troca de experiências pretende integrar os movimentos de renovação temática e a agenda para promover o diálogo efetivo entre diferentes centros de conhecimento. “Não há discurso de descolonização, nem teoria de descolonização, sem uma prática de descolonização”, afirmam.

Tuxá, Guarani e Pequot

“O povo Tuxá, ao qual pertenço, foi profundamente afetado no final da década de 1980 pela construção da barragem de Itaparica, que inundou parte do nosso território tradicional. Ainda hoje lutamos pela demarcação desse território, essencial para nossa sobrevivência. Embora a barragem seja vista pelos não-Indígenas como um símbolo de progresso, para nós teve um impacto devastador na organização social e afetou profundamente a vitalidade do nosso rio (figura 3). Em nossa comunidade, a educação e a escola são essenciais para ensinar às crianças a importância de desenvolver formas de resistência, com um papel central para as mulheres. A arte e a universidade são ferramentas poderosas para defender meu território, construir pontes, compartilhar informações, discutir nossas causas e nos organizar politicamente” (Yacunã Tuxá – ilustradora, pintora e pesquisadora do povo Tuxá de Rodelas, Bahia. Estuda Letras Vernaculares/Espanhol na Universidade Federal da Bahia).

“Não é possível separar o passado do futuro. Falar sobre memória é falar sobre o futuro e resistência. Assim fortalecemos nossa herança cultural, espiritual e as conexões com nosso Ñande rekó – modo sagrado de ser. Vivemos em um mundo globalizado, capitalista e com religiões que advogam para as cosmologias Indígenas perderem suas espiritualidades. Nosso objetivo principal é promover a valorização de nossa cultura, do que é nosso, pois nossos ancestrais nos confiaram a responsabilidade de proteger esse conhecimento. Nós, artistas do território, fazemos parte de um movimento para promover a cura, conscientes de que Pindoretã é um território Indígena e que partes dele estão adoecendo. Quando saímos de nosso território e comunidade, levamos nossas palavras, línguas, práticas alimentares e muitos seres” (Luã Apyká – professor indígena Tupi Guarani da comunidade Tabaçu Rekoypy de Peruíbe, São Paulo. Também é artista, escritor, ativista, contador de histórias e diretor audiovisual).

“Para contar a história do povo Eastern Pequot, devemos considerar os eventos que ocorreram no século XVII, especialmente a Guerra dos Pequot de 1636-1637. Foi neste período que nossa comunidade foi quase aniquilada pelos ingleses que se estabeleceram em nossas terras nas duas décadas anteriores. Fomos proibidos de falar nossa antiga língua e de retornar à nossa terra ancestral. Nossa cultura foi considerada ilegal, e muitos de nós foram vendidos como pessoas escravizadas. Esse período marcou o nosso primeiro genocídio. Após a guerra, os Eastern Pequot retornaram às nossas terras transformadas em reserva em 1683 pelos ingleses antes de os Estados Unidos se tornarem um país. Ainda lutamos incansavelmente para preservar nossa identidade, e a arqueologia tem sido uma aliada poderosa nesse processo” (Natasha Gambrell – apresenta a dança tradicional Eastern Blanket em diversos “pow-wow” – reunião de povos nativos da América do Norte. É professora de língua inglesa e conselheira Eastern Pequot do Conselho Tribal).

Arqueologias Indígenas

Arqueologias Indígenas, Territórios e Direitos Humanos foi o primeiro painel de quatro encontros do seminário internacional sobre povos indígenas e afrodescendentes nas Américas sediado no MAE. O painel coincidiu com o Dia dos Povos Indígenas no Brasil (19 de abril de 2023), data para refletir sobre direitos civis dos povos indígenas, quilombolas, afrodescendentes e comunidades de saberes tradicionais.

A conversa foi mediada por Blaire Morseau, membro da comunidade da Banda Pokagon dos índios Potawatomi (Michigan). Morseau é antropóloga e artista dedicada a conquistar espaços de representação Indígena nas narrativas contemporâneas, centrando-se em temas de ficção científica, futurismo indígena, meio ambiente, ecologia e reivindicações territoriais.

Arqueologias Indígenas, territórios e direitos humanos: diálogos entre representantes Tupi Guarani, Tuxá e Eastern Pequot está disponível no espaço digital Agora, da revista Etnográfica: https://etnografica.cria.org.pt/pt/agora/215

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