O presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva, concedeu a mais alta condecoração da diplomacia brasileira, a Grã-Cruz da Ordem Nacional do Mérito, ao Cacique Raoni Metuktire devido a sua atuação e trajetória política em prol da defesa do meio ambiente e dos direitos indígenas, na sexta-feira (4). A solenidade ocorreu na Aldeia Piaraçu, localizada na Terra Indígena Capoto-Jarina, em São José do Xingu, Mato Grosso, e contou com a presença da ministra dos Povos Indígenas, Sonia Guajajara.
Além de um sobrevoo pela TI Capoto-Jarina, o presidente participou de uma reunião com caciques e lideranças do Xingu para ouvir demandas e tratar da demarcação da Terra Indígena Kapôt Nhinore, situada na Bacia do Xingu, entre os estados do Mato Grosso e Pará, cujas reivindicações existem desde os anos 1980.
A ministra Sonia Guajajara afirmou que o chefe do Executivo assumiu o compromisso de trabalhar com o Ministério dos Povos Indígenas (MPI) e Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai) para concluir a homologação de Kapôt Nhinore o mais rápido possível. Ela frisou que ainda há etapas a serem cumpridas antes da homologação chegar à mesa do presidente.
“Estive aqui com a presidenta da Funai, Joenia Wapichana, no ano passado e assinamos a identificação e delimitação do território Kapôt Nhinore. Logo após a publicação do relatório houve 33 contestações contra o documento da Funai, que está empenhada em respondê-las para seguir com os procedimentos legais de demarcação. Ao terminar, o pedido de demarcação segue para o Ministério da Justiça e depois para a assinatura da homologação do presidente”, relatou a ministra, que reforçou a demarcação de territórios indígenas como a maior bandeira do MPI.
Data histórica
A ministra se referiu à data como histórica por marcar o encontro de duas lideranças globais. “Fica na história porque Lula subiu a rampa junto com Raoni ao assumir o terceiro mandato e hoje vem subir a rampa da terra do cacique Raoni e entender a realidade local. Além de trazer um conjunto de ministros e secretários para assumir o compromisso de apoiar a proteção e a produção nos territórios indígenas”, acrescentou.
Por sua vez, o presidente classificou o trabalho de Raoni como indispensável para as conquistas das últimas décadas para os indígenas, como os direitos assegurados na Constituição de 1988. Lula definiu Raoni como uma liderança que inspira paz, sabedoria ancestral e profundo conhecimento sobre as necessidades da terra e da relação do homem com a natureza.
“Já me encontrei com mais de 120 presidentes do mundo, entre eles o da China; o primeiro-ministro da Índia; o presidente dos Estados Unidos; todos da América Latina e da Europa. Até mesmo reis e imperadores, mas nenhuma dessas pessoas em palácios é mais importante do que essa visita aos povos indígenas do Xingu. Não existe na face da terra nenhum rei mais representativo do que nosso querido Raoni”, disse Luiz Inácio Lula da Silva, ao entregar a faixa da condecoração ao Cacique.
“Hoje é um dia de homenagens, mas também de escutas de demandas de vocês para encaminhamentos de soluções. Tenho certeza que todos vocês sabem, mas faço questão de lembrar sempre que possível: somos um governo que respeita os povos indígenas, reconhece seus direitos e trabalha noite e dia para que sejam assegurados”, afirmou o presidente.
O Cacique Raoni pontuou e cobrou diversas demandas relacionadas à proteção dos direitos indígenas e do meio ambiente durante sua fala. Além disso, ressaltou sua trajetória e a do presidente Lula na defesa das pessoas. “Esse trabalho que o senhor vem fazendo de lutar pelas pessoas, assim como eu fiz, nós dois, então, fazemos o mesmo trabalho. Eu quero que a gente seja exemplo para outras pessoas. Para que outras pessoas também, depois de nós, quando partirmos, essas pessoas possam também continuar defendendo outras pessoas, com esse trabalho de ajudar, de proteger, de garantir a paz para que todos tenham paz”, afirmou.
Compareceram ao evento o ministro do Desenvolvimento Agrário, Paulo Teixeira; a ministra do Meio Ambiente e Mudança do Clima, Marina Silva; o ministro da Agricultura e Pecuária, Carlos Fávaro; a ministra da Cultura, Margareth Menezes; a presidenta da Funai, Joenia Wapichana; o secretário de Saúde Indígena, Weibe tapeba; e a deputada Célia Xakriabá.
Trajetória
Raoni, líder indígena do povo Caiapó, teve contato inicial com não indígenas em 1954, por meio dos irmãos Villas-Boas, indigenistas e sertanistas. O contato serviu de aviso para as ameaças vindas de fora do Xingu e aguçou o ativismo em defesa do território e da cultura de seu povo.
Raoni ganhou reconhecimento internacional em 1987, após um encontro com o cantor e ativista ambiental Sting no Parque Indígena do Xingu. Juntos, fizeram um giro em 1989 para transmitir a mensagem do Cacique Raoni de preservação ambiental para o mundo.
Desde então, Raoni é um símbolo da luta indígena que rodou o mundo para defender direitos indígenas e proteção florestal. Ele visitou comunidades esquimós no Canadá, viajou ao Japão e recebeu o apoio do ex-presidente francês Jacques Chirac. Em 2010, ele se posicionou totalmente contrário à construção da Usina Hidrelétrica de Belo Monte e, em 2011, foi condecorado com o título de cidadão honorário da cidade de Paris.
Kapôt Nhĩnore
A TI Kapôt Nhĩnore possui uma superfície aproximada de 362.243 hectares e é considerada um local sagrado para os povos de ocupação tradicional Yudjá (Juruna) e Mebengokrê (conhecidos como CaIapó). O território está localizado nos municípios de Vila Rica e Santa Cruz do Xingu, no Mato Grosso, e São Félix do Xingu, no Pará.
“Kapôt Nhĩnore” significa, em língua Caiapó, “Ponta do Cerrado”. A expressão se refere à área de transição entre o Cerrado e a floresta, localizada na porção centro-sul da TI. Para os Mẽbêngôkre, as áreas de transição entre floresta e Cerrado são tradicionalmente valorizadas, do ponto de vista econômico, histórico e cultural.
Kapôt Nhĩnore é o local onde se originou o subgrupo Mẽtyktire, os “homens de negro”, ao qual pertence o Cacique Raoni, entre muitas outras lideranças. Não é coincidência, portanto, o fato de a demarcação da TI ter sido reivindicada mais fortemente pelo subgrupo Mẽtyktire ao longo dos últimos 30 anos.
Trata-se da terra onde se originou esse subgrupo, e com a qual ele possui um vínculo originário indissolúvel, que não se enfraqueceu com a demarcação das outras TI’s Caiapó (onde habitam tradicionalmente outros sub grupos Mebêngôkre), mas que, ao contrário, subsiste ainda hoje com bastante vigor.
*Com informações da Funai.