Os inúmeros focos de incêndio que ocorrem na Amazônia, além de prejudicarem a biodiversidade, afetam a qualidade de vida dos moradores da região e arredores, em especial os indígenas. Um novo estudo, publicado na revista Environmental Research: Health revelou que os indígenas na Bacia Amazônica têm duas vezes mais chances de morrer prematuramente, devido à exposição à fumaça de incêndios florestais.
O material particulado da queima de biomassa na Bacia Amazônica pode percorrer grandes distâncias, afetando a qualidade do ar em vários países da América do Sul. Essa fumaça atravessa fronteiras e apresenta um sério risco à saúde humana. Quanto mais próximo se está dela, mais perigosa é.
O estudo liderado por pesquisadores da Universidade de Harvard, nos Estados Unidos, mostrou que Peru, Bolívia e Brasil são os locais identificados como focos específicos de exposição à fumaça, com taxas de mortalidade até 6 vezes mais altas do que as da população em geral. Na Bolívia os números de focos de exposição à fumaça e as mortes em territórios indígenas são de 9 por 100 mil pessoas, já no Brasil é de 12 por 100 mil.
Os especialistas estimam que a fumaça dos incêndios na América do Sul foi responsável por cerca de 12 mil mortes prematuras a cada ano entre 2014 e 2019 em todo o continente, com cerca de 230 dessas mortes ocorrendo em terras indígenas. Dito de outra forma, a exposição à fumaça é responsável por 2 mortes prematuras por 100 mil pessoas por ano na América do Sul, mas 4 mortes prematuras por 100 mil pessoas nos territórios indígenas.
Fumaça perigosa
Pesquisas anteriores já avaliaram o impacto nocivo que essa fumaça têm sobre a saúde humana ou se basearam em dados de internação hospitalar para quantificar a resposta à saúde. No entanto, essas análises não captam o impacto sobre as pessoas que vivem em terras indígenas próximas aos incêndios e que muitas vezes não têm acesso a atendimento médico e podem não comparecer aos hospitais.
Para mensurar esse risco a equipe utilizou uma combinação de modelos de transporte químico atmosférico e uma função de resposta de concentração atualizada para estimar a taxa de mortalidade prematura de populações indígenas. Os resultados mostraram que quando ocorre um incêndio, ele libera concentrações de material particulado fino, mais conhecido como PM 2,5 (partículas finas com um diâmetro inferior a 2,5 micrómetros).
Esse composto é conhecido por contribuir significativamente para as concentrações de aerossóis e impactar negativamente a saúde humana. Essas partículas em altas concentrações são o que contribuem para a morte prematura, uma vez que complicam e agravam as condições de saúde existentes, como doenças cardíacas ou pulmonares.
“Embora os territórios indígenas sejam responsáveis por relativamente poucos incêndios na Bacia Amazônica, nossa pesquisa mostra que as pessoas que vivem nesses territórios experimentam riscos de saúde significativamente maiores devido às partículas de fumaça, em comparação com a população geral”, relata Eimy Bonilla, principal autora do estudo, em comunicado.
O motivo pelo qual ocorrem as queimadas são inúmeros, mas o que mais se destacam nos últimos anos são aqueles impulsionados pela atividade humana, como queimas para pasto, uso de terras agrícolas, mineração, extração de madeira e a variação climática. Além de chegarem aos dados que confirmaram o risco dobrado de morte prematura nessa população, eles também constataram que a exposição a partículas de fumaça é ainda mais perigosa durante a estação seca da Amazônia, entre julho e novembro de cada ano, quando os incêndios florestais mais que dobram o aumento nas concentrações de PM 2,5.
“Esses incêndios estão tendo um impacto desproporcional sobre as pessoas que vivem em territórios indígenas. Com tempos de exposição mais longos e acesso limitado a atendimento médico, às populações indígenas correm um risco muito maior de morrer por incêndios”, disse Bonilla.
A exposição a essas partículas pode resultar em doenças cardiovasculares e respiratórias, câncer, parto prematuro, disfunção metabólica e outros sintomas fisiológicos. “Recomendamos que os governos forneçam assistência financeira para monitorar a qualidade do ar nessas regiões, fornecendo sensores de baixo custo para estudar o impacto da exposição de curto e longo prazo à fumaça”.