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Na semana da visibilidade trans, indígenas defendem os direitos LGBTQIA+ em Brasília

"Somos indígenas e também somos livres para ser quem nós quisermos ser, para sermos felizes da maneira que os encantados nos fizeram e também merecemos respeito”, defende Samantha Terena. Foto: Amanda Lelis | MPI

Em cima do carro de som, vestida de branco e com um imponente cocar cor-de-rosa, Samantha Terena enunciava palavras fortes, enquanto agitava o seu maracá. “Nossos corpos trans-vestidos sempre existiram. E, dentro do movimento indígena, essa pauta não é menos importante. Nossas vidas, enquanto LGBTQIA+, também são importantes. Por isso estamos aqui nessa luta, para dizer que os nossos corpos em si já são uma forma de resistência”, defendeu.

Samantha foi uma das quatro pessoas indígenas presentes em Brasília para as programações da Semana da Visibilidade Trans, com o apoio do Ministério dos Povos Indígenas (MPI). A programação, realizada entre os dias 25 e 28 de janeiro, contemplou uma série de encontros organizados pelo Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania (MDHC), como parte das discussões para a construção da Política Nacional dos Direitos das Pessoas LGBTQIA+.

Em paralelo, também foi realizada a 2ª Marsha Nacional pela Visibilidade Trans, mesas de debate e apresentações culturais, organizadas pela Associação Nacional de Travestis e Transexuais (Antra). Na segunda-feira (27), as pessoas representantes indígenas também participaram do Seminário de Representação e Representatividade Transpolítica, na Câmara dos Deputados.

“É importante que essas pessoas participem dessas agendas para construirmos uma política pública mais específica, que assegure seus direitos e que chegue até as comunidades de fato. Queremos que tenham os seus direitos garantidos nas suas próprias aldeias, que não precisem se retirar da comunidade para viver suas vidas, para amar e também para contribuir com a luta dos povos indígenas”, defendeu Niotxaru Pataxó, do MPI.

Niotxaru, que é coordenador de Política para Indígenas LGBTQIA+ na Secretaria Nacional de Articulação e Promoção dos Direitos Indígenas no MPI, explica que o apoio compõe um conjunto de ações do Ministério voltadas ao fortalecimento dos direitos das pessoas indígenas LGBTQIA+. Entre essas ações, estão o programa interministerial Bem Viver+ e a Estratégia Nacional para Indígenas LGBTQIA+, em construção pelo MPI, que reunirá políticas públicas e protocolos de atendimento, entre outras ações. “Neste ano, vamos realizar uma série de seminários de escuta para construção dessa política nacional, com ampla participação das pessoas indígenas em suas comunidades, nas cinco regiões do país, para ouvir quais são as suas principais necessidades”, explica Niotxaru.

Samantha destaca que os desafios se tornam mais complexos com a interseccionalidade, a partir da sobreposição de opressões e preconceitos relativos aos diferentes marcadores sociais. “A sociedade precisa ser mais sensível, as pessoas precisam se colocar em nosso lugar. Enquanto indígena, enquanto LGBT, enquanto povo de terreiro, ainda sofremos muita discriminação, mas não somos menos, não deixamos de pagar nossos impostos, de contribuir para a sociedade, nem temos menos direitos que outros cidadãos”, defende.

Indígena terena da Terra Indígena Taunay-Ipegue, que fica em Aquidauana (MS), Samantha afirma que luta por um futuro com mais dignidade para as gerações que ainda virão. “Eu gosto de dizer que ninguém tenha medo de ser é, de dar vazão à sua natureza, porque não podemos viver presos e presas num corpo que não nos identificamos, com base num padrão social, por não nos encaixarmos no estereótipo que a sociedade nos impõe. Somos indígenas e também somos livres para ser quem nós quisermos ser, para sermos felizes da maneira que os encantados nos fizeram e também merecemos respeito”, finaliza.

É a segunda vez que Samantha se desloca do seu território para participar da programação da Semana pela Visibilidade Trans em Brasília, contra o preconceito e a violação de direitos das pessoas indígenas LGBTQIA+. “Eu saio de Brasília com um sentimento de muita felicidade por essa experiência de lutar pelos direitos daqueles que ainda virão. Muitos que passaram aqui já tombaram. Muitas pessoas LGBT já tombaram e muitos parentes indígenas também, como Galdino Pataxó. Então, lutamos para que possamos ter mais dignidade”, disse.

Programa Bem Viver+

Em dezembro foi publicada no Diário Oficial da União (DOU) a portaria interministerial que institui o Programa Bem Viver+, focado no enfrentamento à violência e à promoção dos direitos LGBTQIA+ entre povos indígenas e outros povos e comunidades tradicionais. O programa é uma iniciativa conjunta entre os ministérios dos Povos Indígenas, dos Direitos Humanos e da Cidadania, e da Igualdade Racial.

Histórico para a garantia dos direitos humanos a esses grupos no país, o programa foi pioneiro ao reconhecer a LGBTQIAfobia no campo, nas águas e nas florestas e por criar condições para o enfrentamento desse tipo de violência, destinando orçamento específico para projetos e ações em território.

O programa já conta com um núcleo regional no Mato Grosso do Sul, para o atendimento de indígenas LGBTQIA+ do povo Guarani Kaiowá. Entre as ações, são realizadas formações para defensores de direitos humanos LGBTQIA+, oficinas para autoproteção nos territórios, apoio técnico a iniciativas locais, além da promoção de espaços de acolhimento seguros para pessoas em situação de violência que, eventualmente, não possam retornar ao convívio familiar e comunitário.

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