Após mais de cinco anos fechado, o Museu Indígena Pataxó da Aldeia Coroa Vermelha foi reaberto ao público em janeiro deste ano. Nesta reinauguração foi montada uma mostra temporária com curadoria dos artistas Arissana Pataxó e Oiti Pataxó.
A exposição “Ãbakohay ūg kahab: memória e viver Pataxó” reúne artes variadas produzidas pelo povo Pataxó, desde utensílios de uso diário a vestimentas e adereços tradicionais. Arissana Pataxó explica que o visitante também terá acesso a um pequeno acervo de livros produzidos por professores indígenas Pataxó nos últimos 20 anos.
“Esse acervo demonstra a luta árdua das comunidades por uma educação escolar indígena que valorizasse e fortalecesse a cultura Pataxó. Através de documentos, jornais e cartas expostas é possível conhecer um pouco das mobilizações frente às armadilhas governamentais às lideranças e aos territórios tradicionais no extremo sul da Bahia”, conta a curadora da mostra.
Ela destaca ainda que a reabertura do espaço representa mais do que um novo espaço turístico na região. “Acredito que a importância não está somente em abrir um museu, mas criar um espaço em que a memória e a vida do povo Pataxó de alguma forma seja apresentada a partir do olhar do próprio povo”, diz.
Especulação e turismo predatório
Por isso, reafirma Arissana Pataxó, a mostra não é só sobre a beleza artística das peças. “O visitante poderá perceber que, em paralelo à beleza e o primor no fazer artísticos, há também uma luta árdua para nos mantermos enquanto um povo, uma nação frente a todo processo de colonização que se instalou primeiramente aqui nesse território e é perpetuado através do racismo ambiental”, acrescenta.
Dentre os episódios de racismo ambiental apontados por Arissana está a especulação imobiliária que se instalou em toda a região por conta do turismo. A relação entre turismo predatório e especulação imobiliária, aliás, marcam a história do próprio museu.
A partir de meados da década de 1990, a região de Coroa Vermelha foi palco de uma série de investimentos realizados em parceria entre o setor privado e os governos federal e estadual para impulsionar o turismo de massa na do “Descobrimento do Brasil”. Em 2000, foi feita uma grande celebração deste “descobrimento”.
Logo depois, o museu foi progressivamente abandonado pelas autoridades responsáveis, sem um planejamento e investimentos para sua manutenção a longo prazo. Foi a própria comunidade que o manteve funcionando até 2018, mas os diversos problemas na estrutura do edifício inviabilizaram a continuidade do projeto.
A partir 2021, a Universidade Federal do Sul da Bahia (UFSB) passa a participar do projeto de reabertura do museu, efetivado este ano. Arissana conta que há mais de um ano é feito um trabalho de pesquisa, coleta e organização do acervo permanente, que ainda não está em exposição.
Para conseguir reabrir o museu ainda neste verão, foi montada essa mostra temporária, enquanto o trabalho de pesquisa do acerco permanente segue sendo feito. Arrissana Pataxó destaca a importância dos curadores indígenas para a realização de uma exposição em diálogo com a comunidade.
“Foram três meses de trabalho intenso e pouco recurso, que só foi possível por conta da doação de muitos Pataxó, seja na mão de obra ajudando quanto na oferta de suas artes como foi o caso de muitos como Dito, Kapimbará, Do Reis, Seu Zé, Dona Ana dentre outros. Janaron que fez uma belíssima pintura mural em uma das paredes no interior do Museu”, conta.
Curadores
Arissana Pataxó é artista visual de importante produção. Formada em Artes Plásticas na Escola de Belas Artes da Universidade Federal da Bahia (UFBA) e mestre em Estudos Étnicos e Africanos, realizou sua primeira mostra individual em 2007, no Museu de Arqueologia e Etnologia da UFBA.
Dentre as diversas mostras que fez parte estão o I Salão de Arte Indígena na Bahia, a Mostra de Cinema em Ouro Preto e a exposição coletiva “Pimeässä en ole neliraajainen” (No escuro eu não tenho quatro membros), no Centro de Trøndelag para Arte Contemporânea de Trondheim, na Noruega. Atualmente, a artista dá aula de arte e Patxohã (idioma Pataxó) no Colégio Estadual Indígena de Coroa Vermelha.
Oiti Pataxó tem graduação em Licenciatura Intercultural Indígena pelo Instituto Federal da Bahia e é mestre em Relações Étnico Raciais pela UFSB. Também é ilustrador, ceramista e escultor.