Durante o primeiro dia da etapa estadual do Ciclo COParente, realizada na sexta-feira (19), no Centro de Formação Xare, em Manaus-AM, a ministra dos Povos Indígenas anunciou que 360 representantes do movimento indígena serão credenciados para a Zona Azul da Conferência das Nações Unidas sobre Mudança do Clima, a COP 30, que ocorrerá entre 10 e 21 de novembro na capital do Pará.
Na COP de Dubai, promovida em 2023, nos Emirados Árabes, a totalidade dos indígenas presentes de todo o mundo foi de 350 pessoas. Consequentemente, diante do número divulgado pela ministra, o Ministério dos Povos Indígenas (MPI) garantiu, em âmbito nacional, a maior delegação indígena da história das Conferências por meio das indicações das organizações que pertencem à Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (APIB).
As indicações foram apontadas ao longo de seis meses, durante as etapas do Ciclo COParente, criado pelo MPI para mobilizar o movimento indígena e unificar discurso e demandas para o evento em dezenas de encontros pelo país. Como, a princípio, o MPI buscava o total de 500 vagas, um reajuste será feito junto às organizações de base para adequar as indicações ao novo número de credenciais.
“Pautamos 500 indígenas do movimento com o argumento de que a COP será no bioma amazônico e que é importante ter mais indígenas devido à proteção da biodiversidade e preservação da natureza pelas quais somos responsáveis. Conseguimos garantir 360, levando em conta que as demais organizações da sociedade civil conseguiram um representante para cada”, informou a ministra em seu pronunciamento para as aproximadamente 200 pessoas que compareceram ao evento.
De acordo com a ministra, o cálculo para a quantia estabelecida de indígenas na zona azul, onde as negociações da Conferência ocorrem e onde o documento final de intenções é elaborado, foi tomada pela Secretaria Executiva da COP 30 e pela Secretaria-Geral da Presidência. “A conta foi feita diante da demanda apresentada para o governo federal para o credenciamento e chegaram a essa quantidade de forma dialogada para possibilitar o maior número possível de indígenas”, relatou Guajajara.
Ainda segundo a ministra, o número total na Zona Azul deve se aproximar da expectativa inicial de mil indígenas, uma vez que servidores, representantes de outras organizações parceiras do movimento e centenas de indígenas do exterior estarão presentes para encampar frentes contra lobbies da mineração, do petróleo e demais setores contrários à pauta ambiental. A Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira (COIAB), por exemplo, terá 450 vagas divididas em ambas as zonas da COP: a azul e a verde.
O evento no Centro de Formação Xare foi promovido pelo MPI em parceria com a Articulação das Organizações e Povos Indígenas do Amazonas (APIAM) e contou com a participação da Fundação Nacional dos Povos Indígenas (FUNAI), a Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (APIB) e da COIAB. Além da palestra da ministra sobre a COP, a presidenta da FUNAI, Joenia Wapichana, e a diretora de Gestão Ambiental e Territorial da FUNAI, Lucia Alberta, também apresentaram painéis sobre a Conferência.
Ciclo COParente no Amazonas
O Amazonas é o maior Estado em extensão territorial no Brasil, com mais de 1,57 milhão de km², e possui a maior população indígena com quase 500 mil pessoas distribuídas em grande diversidade de povos e línguas. Uma das formas mais comuns de localização geografica é fluvial, valendo-se de calhas dos rios mais importantes da unidade federativa: Purus, Madeira, Amazonas, Japurá, Juruá, Negro, Solimões, Vale do Javari, entre outros.
“Diante desse contexto, organizamos três etapas do Ciclo COParente, sendo que duas foram regionais: a primeira na calha do Rio Purus, para atender a parte sul do Estado, no município de Lábrea, e a segunda na calha do Rio Negro, região do médio e alto rio Madeira, no município de São Gabriel da Cachoeira. Também conseguimos trazer as regiões do Solimões, do Vale do Javari, do Baixo Amazonas, do Baixo Madeira e de Manaus e do entorno para a etapa estadual. Assim, atendemos todo o Estado do Amazonas em cinco grandes regiões”, detalhou Jecinaldo Sateré Mawé, chefe da Assessoria de Participação Social e Diversidade (SEART) do MPI.
A 13ª etapa foi realizada em Manaus. A 11ª e a 12ª foram promovidas nos dias 14 e 15, em Lábrea, e nos dias 16 e 17 de setembro, em São Gabriel da Cachoeira, respectivamente.
“A grandeza dos povos da Amazônia reflete a grandeza do bioma em si. Por isso foi necessário dar a devida atenção ao Estado, já que é o maior do bioma a receber a COP. Por isso, vamos encerrar o ciclo no Mato Grosso, que também faz parte do bioma amazônico, apesar de estar na fronteira entre o Cerrado e outros biomas”, concluiu Jecinaldo, amazonense natural da aldeia Ponta Alegre, no município de Barreirinha, localizado na divisa com o Pará.
Juventude indígena e a COP
Conforme Udimar Kokama, da gerência de projetos da COIAB e aluno da primeira turma do Kuntari Katu, iniciativa do MPI de formação de jovens lideranças para incidir em eventos internacionais, em parceria com o Itamaraty, realizar o COParente em três fases dentro do Amazonas se mostrou um modelo interessante para tratar o que será debatido no evento.
Ele afirma que os conhecimentos tradicionais indígenas são essenciais para contornar o legado de destruição desenfreada que tem como resultado a emergência climática que vivemos, porém, a COP é um local da ONU que exige conhecimento técnico e a linguagem precisa ser incorporada pelos indígenas credenciados. Desse modo, as discussões irão favorecer a pauta de demarcar territórios como forma de mitigar a emergência ambiental.
“Explicar os processos de forma didática instiga os parentes a buscar mais informações e a adquirir mais conhecimento para estar de fato em Belém. Embora nossa participação seja expressiva, não haverá espaço para todo mundo. Por isso, temos que estar qualificados para participar dos debates e o COParente cumpre esse papel”, disse.
Para Lucas Marubo, representante da União dos Povos Indígenas do Vale do Javari (Univaja) e participante do Kuntari Katu, as COPs são espaços estratégicos não só para os governos, mas para os movimentos sociais relacionados aos direitos dos povos indígenas, pois possibilitam acesso à articulações com filantropos e possíveis financiadores diretos em territórios indígenas.
“Vivo na segunda maior Terra Indígena do país, o Vale do Javari, com 8 milhões de hectares. É difícil fazer a proteção dela e investir em projetos socioeconômicos e de bioeconomia. O financiamento direto nos permite gerir recursos em áreas estratégicas, como a equipe de vigilância que temos no território. Apesar dos barcos e equipamentos modernos, não cobrimos 30% do território”, afirmou Lucas ao refletir sobre um dos principais objetivos tratados no Ciclo COParente: a obtenção de recursos por meio de mecanismos de financiamento internacional.