Na Terra Indígena Sete de Setembro, localizada entre o município de Cacoal, Rondônia, até o município de Aripuanã, em Mato Grosso, o povo Paiter-Suruí está preocupado com a gestão do seu território no longo prazo.
O avanço a bioeconomia, atividade econômica baseada na agregação de valor de “ativos” disponíveis na natureza, combinada obrigatoriamente com a preservação e a restauração da biodiversidade, traz possibilidades para os povos da florestas, mas a burocracia e o baixo letramento digital são alguns dos empecilhos para acessá-las, diz Uraan Anderson Surui, vice-cacique geral do Povo Paiter-Suruí.
Para fazer frente a esse cenário, o cacique da Aldeia Gamir buscou na tecnologia blockchain e na Web3 – a nova fase da internet, baseada em blockchain – as ferramentas para capacitar sua comunidade.
Blockchain é a tecnologia de banco de dados criptografados que permite compartilhamento transparente e seguro de informações. São redes de registros públicos permanentes e invioláveis.
É a base tecnológica para criptomoedas e aplicações como contratos inteligentes (smart contracts) e monitoramento de cadeias produtivas, entre outras possibilidades.
Em sua casa na aldeia, a 480 km de Porto Velho, capital de Rondônia, ele abriu recentemente a Amazon Tech House, iniciativa inédita com o objetivo de capacitar as comunidades indígenas da Amazônia, oferecendo um espaço para aprendizado, inclusão digital e proporcionando acesso a recursos tecnológicos.
“Com a nossa tech house temos a possibilidade de nos formar em cursos de ensino a distância, dentro ou fora do Brasil, diretamente da floresta amazônica. Além disso, podemos aproveitar a Web3 para acessar financiamentos para projetos”, disse durante o Finance of Tomorrow, evento paralelo ao G20, grupo de 19 países mais União Europeia e Africana, que acontece no Rio de Janeiro e reúne reguladores, representantes de fintechs, bancos centrais e líderes financeiros.
Para a autoridade indígena, o blockchain também se alinha aos propósitos da Cooperativa Agroflorestal Suruí (COOPSU), voltada a agricultura sustentável e regenerativa, tanto do ponto de vista tecnológico, que permite ganhos para o rastreamento dos produtos e transparência para os projetos, quando do ponto de vista do fortalecimento da comunidade.
“Construímos nossa cooperativa resgatando nossa cultura, que é de cooperação. Percebemos que havíamos perdido essa identidade, entrando num campo de disputas e e concorrência. Isso não deu certo pro nosso povo. E o blockchain traz isso: essa cooperação”, pontuou.
Com a tecnologia blockchain é possível, por exemplo, propor a captação via DAOs (sigla em inglês para Organização Autônoma Descentralizada), comunidades onde propostas com impacto público são avaliadas, votadas e recebem apoio dos usuários em troca de tokens (uma vantagem importante para quem está acostumado a navegar por essa esfera digital).
Essa é uma das razões pelas quais o líder avalia ser importante capacitar seu povo para buscar novos caminhos de impulsionar os projetos.
“Às vezes é mais fácil conversar com um robô do que com um gerente de banco”, diz o cacique da Aldeia Gamir, que é formado pela Universidade Federal de Rondônia na área de Ciências da Linguagem.