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Indígenas e ambientalistas entram na Justiça contra exploração de petróleo na Foz do Amazonas: ‘Não pagaremos a conta da destruição’

Em setembro, pescadores organizaram manifestação contra exploração de petróleo - Divulgação/Rede de Trabalho Amazônico GTA

Organizações e redes dos movimentos ambientalista, indígena, quilombola e de pescadores artesanais entraram com uma ação na Justiça Federal do Pará nesta quarta-feira (22) pedindo a anulação do licenciamento do Bloco 59, que permite à Petrobras iniciar a perfuração de petróleo na bacia sedimentar da Foz do Amazonas. O documento pede liminar suspendendo imediatamente as atividades de perfuração, sob risco de danos irreversíveis ao meio ambiente.

A ação tem como alvo o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recurso Renováveis (Ibama), a Petrobras e a União, e ressalta as falhas do processo de licenciamento, como a minimização dos impactos climáticos da perfuração do poço e a ausência de consulta aos povos indígenas.

“Nenhuma decisão que impacte a vida e os territórios indígenas pode ser tomada sem ouvir quem há milênios cuida da Amazônia’, pontua Toya Manchineri, coordenador-geral da Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira (Coiab). “A consulta livre, prévia e informada não é um favor: é um direito garantido e inegociável”, protesta.

A licença, concedida na última segunda-feira (20), foi liberada após três negativas anteriores do Ibama e mediante “aprimoramentos indispensáveis ao projeto, sobretudo nas medidas de resposta a emergências”, segundo o instituto.

Na avaliação dos especialistas, a exploração de petróleo na Margem Equatorial — faixa que vai do Amapá ao Rio Grande o Norte — vai na contramão das metas climáticas, porque soma o risco de danos ambientais ao incentivo do uso de combustíveis fósseis.

A ação protocolada na Justiça Federal menciona, ainda, o “atropelo” dos povos indígenas e comunidades tradicionais ao longo do processo de liberação da perfuração do poço.

“O próprio Ibama e a Funai já reconheceram os impactos sobre comunidades tradicionais. Ignorar isso é fechar os olhos para a ciência e para a lei”, alerta Nicole Oliveira, diretora-executiva do Instituto Internacional Arayara. “Já logramos precedentes nítidos dos tribunais brasileiros: qualquer licença ambiental concedida sem consulta é nula. O que está em jogo aqui é o respeito ao Estado de Direito e à democracia ambiental”, diz.

De acordo com o documento apresentado à Justiça Federal, não foi realizado o Estudo de Componente Indígena nem Estudo de Componente Quilombola no licenciamento, levantamentos importantes para mensurar os riscos a essas populações. “Na região do empreendimento há terras indígenas e quilombolas, colônias de pescadores, reservas extrativistas, áreas de pesca artesanal, duto de escoamento, Unidades de Conservação (UCs) e rotas de navegação”, informa o texto da ação.

“Além de violar o direito à consulta livre, prévia e informada, previsto na Convenção 169 da OIT, o processo de licenciamento desconsiderou o alerta da Funai [Fundação Nacional dos Povos Indígenas] sobre a necessidade de realizar o Estudo do Componente Indígena”, denuncia Kleber Karipuna, coordenador-executivo da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib). “Exigimos a revisão urgente desta autorização, pois a Amazônia e seus povos não podem pagar a conta de uma destruição que não é nossa”, diz.

A ação foi protocolada na Justiça Federal do Pará porque o estado será um dos mais impactados, de acordo com as organizações que assinam o documento. A exploração na Foz do Amazonas prevê a instalação de uma base de apoio marítima no porto de Belém, que servirá para operações de abastecimento de combustíveis, trocas de tripulação das embarcações de apoio e estocagem dos suprimentos necessários à atividade de perfuração, além do desembarque dos resíduos gerados pela atividade, que serão destinados ao aterro sanitário municipal da capital paraense.

A ação tem assinatura das articulações indígenas Apib e Coiab, além da Conaq (Coordenação Nacional de Articulação das Comunidades Negras Rurais Quilombolas), Confrem (Comissão Nacional para o Fortalecimento das Reservas Extrativistas e dos Povos Extrativistas Costeiros e Marinhos), e das organizações Greenpeace Brasil, Instituto Arayara, WWF-Brasil e Observatório do Clima.

Consulta prévia é direito dos povos

A consulta prévia, livre e informada é um mecanismo de proteção de comunidades tradicionais, estabelecido pela Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), assinada em 1989 e ratificada pelo Brasil em 2002.

Na prática, isso significa que essas populações têm o direito de acompanhar e tomar parte em decisões sobre empreendimentos que impactam os seus territórios. O documento determina que os governos devem conduzir o diálogo com essas populações.

Segundo o artigo 7 da convenção, os povos interessados deverão ter o direito de escolher suas próprias prioridades no que diz respeito ao processo de desenvolvimento, na medida em que ele afete as suas vidas, crenças, instituições e bem-estar espiritual, bem como as terras que ocupam ou utilizam de alguma forma, e de controlar, na medida do possível, o seu próprio desenvolvimento econômico, social e cultural. Além disso, esses povos deverão participar da formulação, aplicação e avaliação dos planos e programas de desenvolvimento nacional e regional suscetíveis de afetá-los diretamente.

O Brasil de Fato procurou o Ibama e a Petrobras para comentar sobre a ação movida pelos movimentos, mas, até a publicação da reportagem, não houve retorno. O espaço segue aberto às manifestações.

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